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quarta-feira, 13 de dezembro de 2006

ESPAÇO DRUMMONDIANO

O que muda na mudança
se tudo em volta é uma dança
no trajeto da esperança
junto ao que nunca se alcança?

LENDA QUE VIROU LENHA OU LENHA QUE VIROU LENDA?

Lá, daquela árvore

que caiu a casca
soltou a tinta
que pintou o pano
tingiu a rede

Lá, daquela árvore

que virou lenha


INCERTO

Orgasmo direto do sujeito composto
sentido no vácuo do pretérito perfeito
ouvido na imperfeição
do verbo intransitivo direto


Esquecido pelo sujeito simples
lembrado pelo superlativo oculto
absoluto num só instante
não é démodé nem moderno


Modernidade escrota entravada teoricamente
reduzida ao ninho na tocaia do vazio
reduto acéfalo bulinado
pela proeza do que se diz esperto

Artifício do provérbio babilônico naufragado
masturbado na massa cinzenta diluída
inutilidade contrária
ao raciocínio sequelado e incerto


segunda-feira, 11 de dezembro de 2006

quarta-feira, 6 de dezembro de 2006

BAGAÇO

Que vida é essa?
Quanto poder de nada poder?


Carona com a solidão
Destino aberto


Bagaço de idéias furtas


Vida, vida, amada vida
Ama-me e não traia-me



CIO DO VAZIO

Paredes vazias
Segregam silêncios
Esquecidos no vazio


Quartos vazios
Integram ausências
Dispersas no vazio


Camas vazias
Refletem desejos
Nostálgicos e vazios


Cio do vazio


PACTO

Descabido pensamento
Inconstante pecado
Rodeia-me com fogo
Trata-me como escravo


Concede-me ao jogo
Sublime pacto


corpo e mente



NÃO DEIXE EM VÃO

Tanto tempo longe
Tampouco para estar lá
Tão perto sempre
Parece não estar


Tempos longos e distantes
Tempos sem se achar


Às vezes o instante de agora
O melhor tempo
Como se fosse inevitável
Único, descobrir


Não o faça amanhã
Hoje, não deixe em vão

COGUMELO PLATÔNICO

Mas afinal o que é o amor?
Um tema filosófico, teológico, artístico, místico?
O escrevemos, pensamos, falamos, sentimos?


Alguns pensadores consideram o amor como uma dimensão exclusivamente humana. Outros vão mais além utilizando determinação do divino como fundamentação, principalmente do seu lado dito positivo — relacionado ao amor de Deus e a sua importância para alcançar a salvação.

Platão foi o primeiro pensador ocidental capaz de elaborar uma reflexão específica e ampla sobre o assunto — que até hoje é inevitável termo de referência.

Em sua concepção o amor é uma força grande e poderosa que se caracteriza no impulso que se dá ao ser humano sinceramente sedento de sabedoria, e por isso dócil a tal impulso, a fim de superar as baixezas da vida material e da experiência sensível para elevar-se rumo às alturas do mundo ideal situado além do mundo físico, onde, segundo Platão, residem a Beleza, a Verdade e o Bem na sua pureza perfeição.

Para Platão o amor significa a disposição para elevar-se em busca do que é eterno, perfeito e imutável. Neste sentido o “amor platônico” revela a sua natureza essencialmente filosófica. Esse amor lança uma ponte entre o universo sensível e o universo puramente inteligível, entre o universo corpóreo e o espiritual, entre o relativo e o absoluto, entre o contingente e o necessário, entre o particular e o universal.

Sendo assim, a condição humana é caracterizada por uma espécie de escravidão da alma em relação ao corpo. O amor, porém, poderá ajudar a alma a reconquistar a sua posição primitiva e originária, contanto que as paixões não ofusquem demasiadamente seu lado positivo, isto é, um lado que, ao contrário, é justamente capaz de exaltar sobremaneira, possibilitando de fato a reunificação da alma com a trancedência.

Se o amor é somente um assunto relacionado à especulação teológica, não sei. Sei que todos os filósofos direcionam atenção especial. Sei que movimenta nossas mais diversas espectativas.


“O amor Platônico é cogumelo:
nasce, cresce,
suas propriedades criam pontes entre universos”

terça-feira, 28 de novembro de 2006

ESPAÇO LEMINSKI - 1


que tudo se foda,
disse ela,
e se fodeu toda

CONJUGANDO

Verbo 1

Eu mando
Tu mandas
Ele manda

Nós mandamos
Vós mandais
Eles obedecem

Verbo 2

Eu mando
Tu mandas
Ele obedece

Nós mandamos
Vós mandais
Eles obedecem

Verbo 3

Eu mando
Tu obedeces
Ele olha

Nós mandamos
Vós obedeceis
Eles olham


Verbo 4

Eu não obedeço
Mas tu não mandas
Ele apenas olha

Nós não obedecemos
Mas vós mandais
Eles nem mais olham

Ninguém faz porra nenhuma

EXUBERÂNCIA

Só os loucos caminhos retratam

Uma exuberante forma abstrata

Distintas palavras várias

Impondo situação precária



Paixão pela forma inexistente

Reluzindo a mente como espelho

Enxergando o que se sente, apenas,

Evitando o que está a frente


segunda-feira, 27 de novembro de 2006

ESTRANHO - 1

Ele olhou-a com olhos ímpetos de malícia. Ela passou e evitou-o friamente. Ele, no impulso irracional do fervor, alcançou-a e atirou pétalas e versos poéticos da mais pura inspiração. Conquistou-a. Então, fechou os ímpetos olhos, e pôs em prática suas malícias.

terça-feira, 21 de novembro de 2006

APENAS AQUILO QUE PODE SER MAIS

Sobre a areia
energizo-me
disparo pensamentos imaculados de razão
jardim sem borboletas
flores falsas
terra pobre
piso na areia que não existe
não tem passo nem leveza
apenas energia
que fantasia pensamentos


segunda-feira, 2 de outubro de 2006

SOLUÇÃO

Ah! Pobre Luiziane! Sempre estava em seu canto, só. Quem via de fora sempre era solidário à causa. Ela repudiava seus colegas. Só conversava com garotos mais velhos e dos colégios particulares. A mãe de Luiziane era diarista e o pai vigilante noturno, ambos, dignos cidadãos. Diziam pelos corredores que ela "comia sardinha e arrotava caviar". Ah! Pobre Luiziane! Estava até com soluço! 




SAPO 3

Um sapo de gravata e salto alto desfilava pelas margens do lago. O sapo estava em campanha. Cantava e seduzia à anfíbios e insetos. As eleições dessa estação serão através do voto direto. Seus descendentes anuros nunca governaram a lagoa, porém, agora como míseros excluídos, são maioria. Seus maiores inimigos, que comiam os rivais, hoje se rastejam em outras lagoas, e os que ficaram, são aliados. Até na própria natureza sapos aliam-se à répteis em busca do poder. Talvez a explicação venha da ciência:"...são ectotérmicos, ou seja, a temperatura do corpo varia de acordo com a temperatura do ambiente". E que também afirma: "Os répteis põem menos ovos que os peixes e anfíbios, pois o sucesso reprodutivo é maior". Os anuros e seus decentes são em maior proporção, são a base do sistema que insiste em ser massa de manobra. Será que homem imita a natureza ou é essa a natureza do homem?


SAPOS 2



O sapo cantava no lago
O sapo comia insetos
O sapo namorava até as salamandras
O sapo não tinha medo das cobras
O sapo zoava

O sapo não "pagava sapo" pra ninguém



Vídeo em homenagem a minha poesia, 
musicado e gravado por Amcle Lima e Lucas VO.


SAPOS 1



O sapo foi morar na cidade
O sapo pulou na rua

entre um pneu e o asfalto crú
descobriu

porque a maioria dos sapos
prefere morar na lagoa



PAREDES

A parede do fundo
fundamenta o mundo

mundo de quatro paredes

onde vivem paralelamente alguns poetas


TRANSE 1

Subi pelos sonhos...

...desci pelo elevador de serviço.


OU VI E FIQUEI SURDO

Ouvi do mesmo ouvido

                         ou, vi do mesmo que ouvi


        absurdo

                                  surdo, fiquei


                       quando vi

                                            percebi 

                                                       nada tinha ouvido





sexta-feira, 29 de setembro de 2006

ALICE

Alice nasceu Alice
Alice cresceu Alice
Alice formou-se Alice
Alice casou-se Alice
Alice procriou-se Alice
Alice envelheceu Alice
Alice morreu Alice

Ali, se encontra um túmulo
Ali, se descobriu Alice

MALANDRINO

Galante urbano
trappolatore machiavellico
tenero vagabondo
cane selvaggio

Impatto favoloso
Indelicato malfattore
vampiro legittimo
sesso traditore

quarta-feira, 27 de setembro de 2006

M I J O

Estava mijando no banheiro quando de repente algo estranho aconteceu. Escapou aquele jato — perdi assim todo o controle sob meu pinto — carimbando a tampa da privada. Olhei ao lado: no chão, duas possas reluziam aquele líquido segregado pelos rins. Uma bela arte. O brilho intenso lembrou-me as orientais pinturas. Relacionei o fato com minhas teias de conhecimento. Lembrei-me de quando  criança: brincava na hora de mijar. Fazia do ato um verdadeiro espetáculo. Tinha o mijo agressivo: aquele que sai com tanta pressão que o sujeito chega a prender a respiração. O barulho da urina em contato com a água da privada parece uma sinfonia xixilarmônica. O mijo reflexão: aquele que você fica horas de pé, olhando para o bilau e nada — enquanto isso se faz uma reflexão da vida, de repente ele começa a sair aos poucos, como uma bela borboleta destruindo seu casulo para voar majestosamente sob os céus. E aquele outro tipo que parece uma espingarda de cano duplo : saem dois tiros contínuos de água prontos para apagarem as chamas da imaginação. Não poderia deixar de fora aqui o mijo à distância, muito praticado na infância e adolescência. Segura-se o corpo do instrumento com força e faz-se pressão interna. Solta-o de uma vez e aquela mistura — água, uréia, ácido úrico e sal — levanta vôo batendo recordes. Há quem conte que certos indivíduos já ultrapassaram a marca de 10 metros, mas aí já entramos em outros méritos. Além disso, existe um fato constrangedor: mijar na cama. Engraçado, na maioria das vezes que isso aconteceu, sonhava que estava fazendo xixi, bem tranqüilo no banheiro. Sentia aquele prazer enorme: pura inocência! No inverno era até gostoso! Tem gente que acha que é só uma incontinência urinária necessária, mas o lado poético do ato de mijar viaja milhas e milhas além. Afinal, como no raciocínio publicitário do Neston, existem mais de mil e uma formas de mijar! Invente a sua!





ECCE HOMO SAPIENS

Eis o homem
sacerdote de seu princípio
aprendiz de filósofo Dionisíaco
o homem, seu próprio ídolo
irremediavelmente fatal
Ressentido, nascido de fraquezas¹
não é prejudicial a ninguém mais
que ao próprio fraco
guerreiro que vinga seus problemas
atira pétalas e chumbo
crítico da modernidade
fã da liberdade
radical em seus valores
em busca de sua maior esperança
infectado pela mágoa em si
insano pela religião e moral
mais um alto "astro do ser"
escolhido ao exílio
precipita-se com prazer no acaso
governa o mundo
chamavam-o de inspiração
eis o homem
tão silencioso quanto um canhão²
antes do tiro


1 - fragmento retirado do livro Ecce Homo (Friedrich Nietzche)
2 - frase de Heine

REFLEXO: 2

Não se esqueça
de esquecer às vezes
pois às vezes esquecer
nem me lembro mais

REFLEXO: 1

Vendo assim o mundo
acredito a cada segundo
que acreditar assim num mundo
e assim vê-lo a cada segundo
seja plenamente profundo
tão quanto acreditar nesse mundo

MOMENTO (ALGUM, DE ALGUMA SÉRIE)

Nada vejo além deste momento
sempre, além, vejo assim mesmo
Isso não passa de um vício
não caminho pra lugar algum
Existiam, fés-de-meia, pés-de-meia
acreditavam que tudo fim teria
Nada passa por minha prudência
além do vento cortante
míseros larápios
não entenderão a simplicidade
simples igualdade
pluralidade
denominarão como um descarte
Isso não passa de um erro qualquer
não caminho pra lugar nenhum
ficamos sós
(aspecto de profundo conhecimento)
momento protesto
somente
Nada vejo, além deste
e sempre, além, vejo-o

POETAS & GERMES


Decompõe-se no papel
estranhos eles

impercebíveis
como verdades

destacam-se por não destacar-se
planos vencidos

fio da faca imaginária
luz invisível

calibre da tinta
musgo do ventre

germinam

poetas e germes


PROCESSANDO

Cúmplice processo
abcesso oculto
luto distante
constante esfera

Espera mista
egoísta instante
à vante acaso
apreço místico

Nocivo lar
mar submisso
omisso abismo
cismo esteriótipo

neurótica evolução

AMORE ILLECITO




Imbecilità inabile
lezione liberale
letale libertà

Flaccidezza felice
filosofo forestiero
romanzo sanguinante


segunda-feira, 11 de setembro de 2006

CASO 2: NEGAÇÃO

Que dia: nada dá certo! Tentei me distrair. Não consigo tirar das cabeças. Noite passada: mal dormida. Sonhos embaralhados. Muito estranho. A única coisa que senti: sentimento de culpa. Afirmo: não sou culpado! Não sou culpado! Puta que o pariu! É a primeira vez que isso acontece. Tenho três filhos, 52 anos bem vividos, não vai ser agora que vou tomar esse tal Viagra.

CASO 1: SEDUÇÃO

Só de vê-la saciava uma fonte inesgotável de desejo. Adoro o cheiro. Pele bronzeada atrai o pecado. A cada mordida sinto um intenso gozo. Imenso sentimento de arrependimento. Mas, o instinto animal é fiel traidor. Hoje, com 31 anos, 126 kg, estou completamente decadente. Não como ninguém além da comida. Maldita gula!

LÁPIDE 2: OLHOS NÃO VÊEM! A ALMA SENTE!

Aqui jaz

um poeta míope










Vício 2

O galo cantava quando fui dormir. Acordei o sol já estava brincando de esconder. Assim, vários dias corridos à fio.

[Sinto que esse lado "boêmio-poético" está alterando meu funcionamento biológico e espacial.]

Só percebi quando a segunda-feira chegou.

Vício 1

Passava de duas da madruga quando levantou da cama. Dirigiu-se à cozinha para comer algo. Tentava dormir à horas. Resolveu confrontar a insônia. Comeu levemente, escovou os dentes. Voltou para a cama e sentou. Retirou do criado mudo um caderno onde descrevia detalhes das noites de insônia. Sempre fiel ao horário. Despertou através da insônia um grande talento, e nem percebeu, que há muito tempo não sofre mais desse mal.

Frusto

Carlos foi o primogênito de um casal da alta sociedade. O sonho dele sempre foi ser músico. Os pais nunca aceitaram. Formou-se em medicina há quase 15 anos. Porém, nunca sentiu prazer em atender pacientes nem no ofício. Ele sofre de insônia crônica e se sente deprimido. Carlos é um sonho frustado que foi realizado pelos pais.




Mentiras ou verdades?

De tanto mentir, acreditava que suas mentiras eram verdades. Não gostava de verdades. Quando morreu, um anjo veio lhe buscar. Não acreditou. Achava ser mentira. Quando descobriu que era verdade, decidiu acreditar que estava vivo.

Salvação

Simão da Conceição, 58 anos, pescador de profissão. Quando aporta das sua longas pescarias, a primeira coisa que faz é tomar um trago de caninha no boteco da esquina. Fuma desde os 13 anos de idade. Julga-se ateu. Desde quando casou, há 40 anos, nunca mais pisou em algum tipo de igreja, nem rezou para um deus ou santo qualquer. Descobriu que está com câncer nos pulmões e cirrose nos fígados. Levanta escondido todas as noites, liga a tela num desses programas religiosos -que prometem expulsar demônios, curas milagrosas e trazer felicidade- e não desvia um segundo da atenção. Simão da Conceição crê que não crê.


União

Silêncio e céu esquivo. Luzes repletas de insetos. Grilos em sinfonia. A lua minguante observava as estrelas. Tudo parecia ser tão leve. Na rua das Graças, número 16, o solitário Mário César faleceu. Uniu-se ao silêncio.



Recíproco

Era uma vez um marido leal. Pagava todas as contas da casa e faculdade dos filhos. Fazia amor -na mesma posição- todos os dias com sua amada esposa. Nunca chegou atrasado ao trabalho nem desmarcou um compromisso. Dormia todos os dias no mesmo horário e acordava antes do sol. Foi a rotina em pessoa. Não fumava, não bebia. Não gostava de música. Achava arte uma bobagem. Morreu aos 42 anos, vítima de si mesmo.


Nudez

O homem nú se despia. Caiam lágrimas e cinzas. O fio da faca amolou em seu pulso. Deixou cair seu último traje: o corpo. Sua alma ficou nua.


APENAS

Não há mistério
apenas dúvidas
falsas razões
fragilidades
#
Não há respostas
apenas perguntas
falsas verdades
desconstruções
#
Não há pecado
apenas lendas
falsa moral
obscenidade
#
Não há crime
apenas desvios
falsos estágios
eutanásia

quarta-feira, 6 de setembro de 2006

Oriundo

Eis que aqui estarei ao retorno do mundo
Esperar-te-ei ao contorno profundo
Buscando sem contingentes, simples mergulho
O que pode parecer oriundo ou absurdo


Viveis o tormento insano pelas curvas estreitas
Atormentas o que não percebes, sempre sua direita
Sorriso, a quem pode, não convém à desfeita
Construir-te-ei, e não serás meu orgulho, a tua tristeza

terça-feira, 5 de setembro de 2006

Prazer e Medo

Numa esquina qualquer
O prazer e o medo
Prazer: cantando
Medo: calado
Prazer: dançando
Medo: sentado
Prazer: abrindo
Medo: fechado
Prazer: feliz
Medo: magoado
Na mesma esquina qualquer
o prazer descobriu que o medo
é o prazer de quem não tem medo

segunda-feira, 4 de setembro de 2006

LÁPIDE 1: Embalagem




Criem-me em seus pensamentos
Imaginem hipóteses
Isto é só um túmulo
Foi-se apenas a matéria

A anti-lógica poética sobreviveu!


TRANÇAS E TROÇAS

Todos esses aí
Trocados por trocados
Onde estão?
Cheios de troças
Traçados estão eles
Eles quem?
Refiro-me a quem? Qual?
Similaridade
O último tango de imbecís
Quem são imbecís?
Todos esses aí
Inclui-se o reflexo do espelho
Mão, corpo, mente, autor
Trancei-me



QUEM?

Só comigo mesmo
tolo à toa
fé-falível
obstinado-meio
alcalino
sois quem sois?
celífluo
anti-cavo
osso-do-pão-ralo
serei-o
mesmo comigo só

SENTIDOS

Sentidos
assim implicam
decompõe-se
chama acesa

Fortes
inspiram lógica
indicam
o quase entender

Crus
prontos-semi
digeríveis
guiam-nos

Caminhos



Certo e Errante

O primeiro: perto
O segundo: distante
O primeiro: formal
O segundo: quebrante
O primeiro: esposa
O segundo: amante
O primeiro: pronto
O segundo: mutante
O primeiro: certo
O segundo: errante

quinta-feira, 31 de agosto de 2006

Nostalgia

Tu vives

numa nostalgia qualquer
[sentes o nada]
vives do que não mais pode
[olhas o que não mais és]

mas

tu vives assim mesmo!

Desdém

Olhares acuados de pessoas desdenhadas
Diagramação de palavras agônicas
Sentindo-se condicionados pelo acaso
Saboreando à prato nulo

Gestos, restos de perdão arruinados
Rentes, palma da mão batendo à cara
Linguagens discrepantes e nuas
Conduzindo ao estado de dormência

Pensamentos brancos, claros, vãos
De pesares adelgaçados
Lançados do caos ao cais
Acorrentando agilidade e paciência

CASO COM ACASO



Antes: ausência
distância eterna
imperceptível patógeno
necrose cardíaca

Agora: sede pouca
amargo mel
distúrbio ilusório
compensação assimétrica

Depois: osso do pão ralo
lance perdido
alma sem limbo
caso com acaso




FUTILIDADE DO MÊS DE NOVEMBRO



Hoje acordei assustado no meio da noite. Desciam pelo corpo calafrios transportados por gotas de suor. Foi uma espécie de ânsia protagonizada por eu mesmo. Desorientado e sem nenhuma excitação nervosa exterior, descansei pouco mais. Levantei e fui ver o que estava passando na TV — mais um daqueles programas religiosos em que o pastor afirma ter feito milagres e depois passa o número da conta e agência bancária — desliguei-a, pois estava quase me emocionando. Regressei à cama e me evolvi entre travesseiros deformados e lençóis perfumados de marofa. Mirei para o teto descobri de onde viria uma lendária goteira que escorria entre o vão da parede e o guarda-roupa, que sempre fica com as portas abertas para sair um pouco do cheiro de mofo. Num momento desenhava todo o teto, confundia-o com as nuvens de algodão — o tom escuro decorrente do bolor do teto me dizia que a previsão era para tempo ruim. A janela, a qual eu fixava olhares sobre os pregos enferrujados pela maresia, estava estranhamente nodoada. Zangou-se com a limpeza. A umidade salobra a deixava embaçada. Levantei vagamente da cama, caminhei até a sala, e sentei no meu novo antigo sofá, abrigo caseiro dos cupins, formigas e pequenos coleópteros. A estante: escudo de minhas idéias. Abriga livros perfurados por traças, edições amareladas do Primeira Pauta, CDs riscados e fotografias foscas de uma era sapiens. Há um grande amigo escondido naquela estante, dentro de alguma página perdida. O conselho certo para a hora certa. Olhos cansados: fechei-os. Imaginei o teto: diferente, tom mais fosco, como se agora estivesse limpo, com algo esculpido a qual não decifrei (pode ser que sejam as cavidades conseqüentes do mau reboco). Na estante: somente um livro. Não me contive, fui crê-lo. Sem codinome e progenitor, teor nulo. Progredi o processo de osmose cerebral misturado a ressaca da noite passada. Ganharam formas as letras, aos poucos. Minha lupa direcionada trincava-se. Li-as. Retornei à cama. Aspirei e transpirei em meu sonho. 11h47: Despertei suado. Acendi um cigarro barato e digeri um café adormecido. Tranqüilizei-me pouco mais. De volta ao velho sofá liguei novamente a TV, que insistia em apresentar chuvisco e ruídos. Olhei para a geladeira Cônsul modelo 1984, cor azul desbotado: estavam lá um calendário e a conta de água e luz, empenhadas. Pautaqueoparéu! Novembro! Preciso trabalhar!

José Eduardo Calcinoni

Há controvérsias!

C O N T R A T O




Celebram contrato
amor e pecado

come-se ao prato próprio
deseja-se a comida ao lado